sexta-feira, novembro 24, 2006

Outono na minha terra


Depois da forte chuvada, num dia em que o verbo ventar se fez presente, milhares de sobreviventes reuniram-se em praça pública para prestar o último adeus aos mortos, cujo número chegou já aos mil, embora a recolha continue.

Só eu vi seis espalhados por diversos caixotes, mesmo ao lado dos jornais e das cascas de banana. Outros tantos em valas comuns, rotos, rompidos, rasgados. Mortos.

Dois morreram mesmo à minha frente, estraçalhados pelos elementos naturais, a saber: muito ar, muita água e muita falta de jeito.

Condoída, é como estou, porque se há dias em que não saio de chapéu-de-chuva são dias de chuva.

Imagem roubada, claro está.

segunda-feira, novembro 20, 2006

Do tamanho das coisas

mas porque é que há gente que ignora a maiúscula?

Eu cá começo sempre uma frase com uma letra tamanhosa, e até já ponderei seriamente pôr uma letra tamanhosa sempre que começo uma palavra. Mas dá trabalho, e o trabalho, por menor que seja, estará sempre de bom tamanho.

Enfim, problemas de tamanho tiram-se de letra.

Ainda o antónio e a cleo

Amar é destruir.

sábado, novembro 11, 2006

An Inconvenient Truth

Ladies and gentlemen,

We are not glad to present you “An Inconvenient Truth”.



Take a look and make your decision. Do you want a better place, or do you want no place at all?

sexta-feira, novembro 03, 2006

Só por existir.


E agora, J.?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, J.?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, J.?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou

e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, J.?

E agora, J.?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
J., e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse

a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, J.!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, J.!
J., para onde?


Itálicos de Drummond de Andrade